terça-feira, 2 de outubro de 2012

Bicicleta sem rodinhas

Acabo de fazer a minha primeira degustação depois de formado Sommelier de Cervejas. Nossa turma concluiu seus estudos no último sábado, no Senac São José dos Campos, coroando a formação com uma brassagem coletiva na Montanhesa, que pertence ao Alexander Van Parys Piergilli (acho que acertei o nome, hehe), no sítio Gralha Azul, em Santo Antonio do Pinhal-SP. Iniciando esse vôo solo (mas que também pode e deve ser solidário e acompanhado pelos demais colegas, que se tornam, cada vez mais, amigos) os sentidos estão mais apurados, a familiaridade com os estilos e escolas, presente...e até mesmo alguns defeitos são notados. Agora, com conhecimento de causa, me aventuro e delicio no mundo cervejeiro. Ainda não tenho claro, exatamente, por que porta vou entrar nessa profissão, mas as possibilidades são muitas.
Fica aqui o agradecimento público aos colegas, que enriqueceram o aprendizado e proporcionaram momentos saborosos, aromáticos, engraçados ao longo desses doze sábados. Registro também o agradecimento especial ao Mestre Zé Márcio, proprietário do Dona Sarah Bar, em Cachoeira Paulista, que transmitiu de forma irretocável conhecimentos sobre a cultura cervejeira de forma geral. Valeu, Zé! E é isso.
Saúde.
Os mais de 120 rótulos degustados ao longo do curso

segunda-feira, 24 de setembro de 2012

Pra pensar nas tradições

Sou professor de História e, consequentemente, muito apegado às histórias e estórias da cerveja. Também sou um apaixonado pela cultura brasileira. Assim, desde que comecei a estudar sobre cervejas e cultura cervejeira, o que mais me chama a atenção é o aspecto cultural de todo esse universo. Confesso que senti um certo desconforto, no início. A cerveja é um produto que não é "originário" do Brasil, apesar de ser amplamente consumido por aqui. E isso me fazia pensar, algumas vezes, que falar de cultura cervejeira no Brasil era forçar a barra. Realmente, por um lado, acho que é. Mas por outro, tenho razões para achar que não.
Eu me explico. Realmente, falar, hoje, de uma cultura cervejeira, da mesma forma que ela está organizada nos países de tradição cervejeira, é forçar a barra. Ainda engatinhamos no que diz a termos hábitos saudáveis e de consumo de cerveja de qualidade. No Brasil, infelizmente, cerveja ainda é, para a grande maioria das pessoas, uma bebida cor de palha, sem gosto, sem cheiro e que deve ser consumida aos litros. Não levamos a sério (os brasileiros, no geral) o lema do "beba menos, beba melhor". Mas isso, felizmente, está mudando: cada vez mais pessoas descobrem os prazeres das cervejas de boa qualidade, com dua diversidade de aromas e sabores.
Quanto à presença da cerveja no Brasil, acho que há argumentos para acreditar que não seja nenhum "estrangeirismo" exagerado, cultivar a tradição cervejeira em terras tupiniquins. Acredito que pela "juventude" do nosso país, não se pode falar em tradições genuínas brasileiras. Nosso processo de colonização, por si só, já foi marcado pela introdução de elementos culturais "forasteiros". Não quero menosprezar a matriz cultural dos povos indígenas. Pelo contrário, acredito que ela mereça o mesmo destaque que as demais matrizes. Acontece que indígena não é sinônimo de brasileiro. Tornamo-nos um país, propriamente dito, a partir do século XIX. Com algumas divergências teóricas, podemos afirmar que nos reconhecemos como brasileiros há cerca de 200 ou 200 e poucos anos. Temos, é claro, elementos tradicionais, com mais do que isso, como por exemplo a cachaça, que data do século XVI e é um produto com a cara do Brasil.
Mesmo assim, falar do cultivo de uma tradição e cultura cervejeiras no Brasil não é render-se aos valores europeus. Da mesma forma que tivemos portugueses, espanhóis, indígenas, africanos das mais diversas etnias presentes na formação do povo brasileiro, também tivemos a presença marcante de imigrantes oriundos de nações com tradição cervejeira, como a Alemanha e a Inglaterra. Para se ter uma ideia, a cervejaria cervejaria artesanal mais antiga do Brasil, a Canoinhense, de Santa Catarina, do emblemático seu "Lefra", foi fundada em 1908.
 Cervejaria Canoinhense, SC
Seu "Lefra"

Nesse caso, de 200 anos de vida civil como um país independente, temos uma cervejaria com 100 anos. Além disso, o primeiro registro histórico de fabricação de cerveja no Brasil data de 1836, ou seja, dos primórdios da nossa vida política e organização como um país. Isso ajuda a demonstrar que a cerveja é um alimento com história dentro da nossa História. Ainda que nossa cultura tenha começado a ser gestada desde o século XVI (ou até mesmo antes disso), o Brasil não existia até 1808. Éramos apenas a América portuguesa. Logo após o início de nossa história (mais ou menos) autônoma, com a chegada da Família Real Portuguesa em 1808, já temos nossa tão querida bebida presente aqui.
Acho que, assim, consigo ilustrar um pouquinho da nossa "tradição" cervejeira e demonstrar que cerveja pode sim, ser vista como um produto brasileiro, ligado à nossa história e à nossa tradição. Mais que isso, acho que é importante lembrar que a nossa história e a nossa cultura, não estão prontas e acabadas: ainda estão em construção e o papel da cerveja em nossos hábitos e costumes ainda está por ser definido. Eu, particularmente, aposto no enraizamento desse delicioso hábito que, assim como a cachaça, o açaí, a carne-seca, a mandioca e a feijoada, tem tudo para se tornar um produto nacional.
É isso. Saúde!

segunda-feira, 10 de setembro de 2012

Cervejarias: Bamberg - Votorantim, SP

Em julho deste ano tive a oportunidade, com a turma do curso de Sommelier de Cervejas do Senac São José dos Campos (SP) e o professor Zé Márcio, de visitar a Cervejaria Bamberg, em Votorantim (SP).
Na fábrica, fomos recebidos pelo sócio-proprietário e mestre cervejeiro Alexandre Bazzo, que se encarregou de uma ótima aula sobre processo de produção de cervejas, sobre a Bamberg, sua filosofia de trabalho e cultura cervejeira, em geral. Foi uma experiência única. Ainda mais para mim, que fazia minha primeira visita a uma cervejaria.
Logo de cara, fomos apresentados ao processo de produção cervejeiro, matérias-primas e a história da cervejaria Bamberg.
Uma das coisas que mais chamou minha atenção foi o acesso que tivemos a toda a fábrica: fotografias liberadas; perguntas, então, nem se fala... Sem medo de "espionagem", Alexandre Bazzo liberou tudo. Essa liberdade que nos foi dada é fácil de entender: a Bamberg trava um fecundo intercâmbio com cervejeiros da cidade alemã de Bamberg (em homenagem à qual a cervejaria  foi batizada). Enfim, fica claro que o know-how faz toda a diferença no ramo das cervejarias.
Também chama a atenção o cuidado e controle sobre todo o processo. Enquanto nos guiava pelos tanques de fermentação, Bazzo várias vezes orientou os funcionários sobre ajustes a se fazer.
Alexandre Bazzo dando uma aula sobre processo de produção cervejeira

Filosofia

A proposta da Bamberg é ser uma micro-cervejaria. Assim como acontece na Alemanha, a filosofia de trabalho orienta-se pela qualidade, privilegiando a distribuição local dos produtos. Não para restringir o acesso de regiões mais distantes às cervejas Bamberg, mas pelo fato de que uma cerveja que "viaja" menos desgasta-se menos e mantém sua qualidade por mais tempo. Na Bamberg, vivencia-se a tão falada cultura cervejeira. O apelo é pelo consumo de qualidade e não de quantidade.

Visão geral da Bamberg

Parte chata da visita



A dor do parto

Sair de perto dos tanques de fermentação, dos quais pudemos provar o conteúdo, é difícil. Mas é uma tarefa que fica mais fácil com uma passadinha na loja da fábrica e em restaurantes da região que servem chope Bamberg. Ao final do dia, voltamos todos muito mais felizes do que havíamos chegado... e com gostinho de quero mais...
Saúde.

Uma passadinha na loja, ao final da visita, é obrigatória


Para acessar o site da cervejaria Bamberg: www.cervejariabamberg.com.br

terça-feira, 14 de agosto de 2012

Cerveja, História e Religião

A cerveja é uma bebida produzida a partir de grãos. Assim, sua origem, segundo historiadores, está ligada às civilizações que conseguiram dominar a agricultura, no período chamado de Revolução Agrícola. O que aconteceu nesse período, na prática, foi que os homens (muito provavelmente, as mulheres) compreenderam a técnica necessária para se plantar e colher alimentos. Até esse momento, o homem era nômade, ou semi-nômade, caçando animais e coletando os alimentos necessários à sua sobrevivência, mudando-se quando estes se esgotavam.As primeiras civilizações surgiram daí. Com o homem fixado, a população cresceu, surgiram as primeiras cidades e estruturas hierárquicas de poder. Provavelmente, em um "acidente", grãos armazenados sem proteção devem ter passado pelos processos de malteação e fermentação, dando origem à cerveja.
Entre esses povos, o sucesso da colheita era, também, a sobrevivência de todo o grupo. Por isso, entre essas civilizações é comum a presença de cultos, deuses e divindades ligados à virilidade, à reprodução, à fertilidade. Não se trata só da conotação sexual de tais ideias, mas também da perspectiva natural que elas têm: o homem que fecunda a terra; a terra que é fértil e produz o alimento; a vida que se reproduz. Vários momentos do ano, ligados à mudança de estações, aos períodos de colheita tornaram-se motivos de festas e festivais religiosos. Esses festivais pagãos foram, com o passar dos séculos, incorporados às tradições cristãs. Acontece que a cerveja deve ter adquirido um papel importante nesses ritos e festividades, que acabou permanecendo, mesmo com as mudanças religiosas.
É por isso que vemos a existência de vários rótulos e estilos de cervejas que são feitos em momentos específicos do ano. Um bom exemplo, são as cervejas DoppelBock. Originárias da cidade de Einbeck, na Alemanha, eram produzidas na segunda quinzena de março, período em que há o equinócio de primavera no hemisfério norte (fim do inverno e começo da primavera) e o dia de São José. Nesse período, os sacerdotes passavam por jejuns, em que não podiam comer nada durante o dia. Contudo, beber não estava entre as proibições. Para isso, uma cerveja forte era preparada.
Esse ano tivemos um resgate dessa tradição, realizado pelas cervejarias Bamberg e Abadessa, como já publiquei aqui, em maio desse ano (http://www.belogole.blogspot.com.br/2012/05/starkbierzeit-2012-bamberg-e-abadessa.html).
Como se pode ver, o consumo da cerveja sempre esteve ligado a uma ritualização. Nada mais justo que valorizemos essa forma de consumo. Cada um pode criar o seu "ritual", desde a escolha do rótulo, o momento certo para degustá-lo, a companhia ideal para celebrar até o momento do consumo propriamente dito. Em outras postagens tentarei trazer mais algumas informações sobre a Cerveja ao longo da História.

segunda-feira, 16 de julho de 2012

"Beba menos. Beba melhor" - mudanças de hábitos na mesa (e no copo) dos brasileiros

"A cerveja produzida com amor é bebida com parcimônia."

Esse é um dos princípios da produção das famosas cervejas trapistas belgas. Mas é uma ideia que também se aplica a outras cervejas, talvez não tão famigeradas como as belgas. Aqui no Brasil, temos esse lema traduzido em outras palavras:

"Beba menos. Beba melhor."

Quem está habituado com as chamadas cervejas especiais já deve ter visto essa expressão em alguns rótulos. E estas duas frases guardam uma ideia muito grande e cheia de significados.
Em primeiro lugar, você não vai encontrar essa ideia estampada nos rótulos das cervejas de grande mercado, produzidas em grande (enorme) escala. Não. Estas marcas associam, quase sempre, seus produtos ao grande consumo, com campanhas publicitárias que recorrem ao apelo sexual (e machista) e de sedução. Dizer para o seu consumidor "- Beba menos." é impensável para essas gigantes detentoras de mais de 98% do mercado cervejeiro brasileiro.
Essa não é a realidade das microcervejarias (micro, pequenas, nanos), que estão, no Brasil, ensaiando um grande crescimento. Crescentes em quantidade desde a segunda metade da década de 90, as microcervejarias e o mercado de cervejas especiais começa a definir, também, uma filosofia.
Não acredito que haja uma uniformidade e união harmoniosa entre todas as microcervejarias. Mas, pode-se dizer, que, a partir de algumas iniciativas um mesmo discurso começa a ser elaborado. Para essas cervejarias, cerveja não deve ser consumida sem se pensar, somente. No mundo das cervejas especiais, as cervejas não são todas iguais. Existe uma diversidade enorme e, a cada novo rótulo que o consumidor descobre, descobre também novas experiências gustativas, sensoriais, gastronômicas. Cerveja, para essa nova proposta, não precisa ser consumida "estupidamente gelada", somente. Também não é preciso estar na beira da praia, cercado de mulheres semi-nuas para haver motivo para uma boa cerveja. A cerveja pode estar presente numa celebração e também em um momento familiar. Naquele restaurante fino, de alta gastronomia, harmonizando com pratos rebuscados, ou na sobremesa, ou, até mesmo, acompanhando aquele hambúrguer caprichado, numa lanchonete bacana, por exemplo. E ainda há cervejas que caem muito bem naqueles momentos especiais, que podem substituir, se for o seu gosto, até o famoso champanhe...
Como já foi dito acima, as cervejarias com essa proposta não chegam a ocupar 2% do mercado cervejeiro nacional. Em países como os Estados Unidos, já ocupam um espaço um pouco maior. Aqui, ainda podem crescer muito. Mas esse é um processo de mudança cultural, que leva certo tempo a se consolidar. O poder aquisitivo do brasileiro médio tem crescido. Com ele, produtos que antes eram vistos como rebuscados, caros ou muito chiques, estão mais acessíveis a muita gente. No caso da cerveja, podemos ter esperança: quem prova de uma boa cerveja dificilmente não se apaixona... é só experimentar, e embarcar nessas novas sensações.

sábado, 14 de julho de 2012

Slow Bier Brasil


No último dia 09, o evento Extramalte, organizado mensalmente, liderado por Sady Homrich, recebeu o cervejeiro Marco Falcone, da Falke Bier, de Belo Horizonte, para falar do movimento Slow Bier. Esse movimento foi lançado no Brasil em 2009, com uma proposta semelhante à do Slow Food. Com essa proposta, o que se procura é levar o slogan "Beba menos, beba melhor" ao dia-a-dia das pessoas. Em resumo, trata-se de valorizar a cerveja como um alimento, com diversas possibilidades gastronômicas, capaz de proporcionar momentos de prazer e degustação que valorizem a qualidade e não a quantidade.
Impossível não associar essa ideia ao mercado das microcervejarias e cervejarias artesanais brasileiras. Esse mercado em crescimento tem como maior preocupação valorizar a diversidade da cultura cervejeira e apresentar uma nova forma de se consumir cerveja: nada de estupidamente gelada! O que se quer é que as pessoas aprendam, ou melhor, descubram, novas formas de saborear cerveja, sem pressa, sem o objetivo de só saciar a sede e encher a cara.
A seguir, reproduzo o texto de Falcone sobre o movimento:
"No dia 25 de abril de 2009 foi lançado o movimento Slow Bier Brasil, com princípios similares ao Slow Food, com o intuito de valorizar a produção de cervejas de qualidade, bem produzidas, utilizando matérias primas nobres, boas práticas de fabricação, além de conceitos como fair trade (comércio justo), sustentabilidade e respeito ao meio ambiente. Preocupação com o consumo responsável, com cordialidade e convivialidade, com o prazer gastronômico que a cerveja pode proporcionar. Mas, além disto, o movimento se preocupa também com a forma de viabilizar isto, já que é muito mais dispendioso alcançar todos estes requisitos do que produzir em escala industrial, abolindo todas estas preocupações.
O Slow Bier Brasil quer mostrar as vantagens destas práticas que irradiam cultura cervejeira, mas tem que abordar também os desafios e dificuldades, que vão, desde a desproporcionalidade do poderio econômico com relação às mega indústrias até aos percalços da regulamentação, burocracia e tributação.
Desde sua criação o Slow Bier Brasil, que tem como símbolo um bicho preguiça (diferente do Slow Food, que utiliza um caramujo), tem procurado se manifestar e obter adesões em eventos pontuais, como no último ano no Festival Slow Film de Pirenópolis/GO, entre outros.
No lançamento, em 2009, foi feita uma vídeo conferência no bar Frei Tuck Slow Beer, em Belo Horizonte (que já não existe mais), com o movimento correspondente na Alemanha, e que iniciou o conceito, brindando também com Porto Alegre (Leo Sewald e Caroline Bender representando a Acerva Gaúcha) e Campinas (David Figueira e Maurício Beltramelli – Acerva Paulista), além dos cervejeiros da Acerva Mineira, Acerva Carioca, CONFECE (Confraria Feminina da Cerveja de Belo Horizonte) e FEMALE (Confraria Feminina da Cerveja do Rio de Janeiro), estes todos presentes in loco.
Pedimos a adesão de todos na data de hoje, quando estaremos levantando novamente a bandeira do movimento no Extramalte, do cervejeiro Sady Homrich, no Studio Clio, às 20 horas desta segunda-feira.
Um abraço a todos e Pão e Cerveja.
Marco Falcone"

segunda-feira, 2 de julho de 2012

Novo webprograma cervejeiro: Conhecendo Cerveja, do blog All Beers

O blog All Beers acaba de lançar o 1º programa do projeto Conhecendo Cerveja. Mantido por Raphael Rodrigues Sommelier de Cervejas e Administrador no Brasil do Rate Beer, o blog apresenta nesse projeto cervejas diferentes, sempre em um bate-papo com um convidado, com o objetivo de divulgar a variedade cervejeira que existe por aí. Vale muito a pena conhecer e assistir ao programa. Olha lá.